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Este blog tem por objetivo mostrar meu trabalho em sala de aula, trocar experiências com professores e alunos e receber sugestões metodológicas, exemplos de projetos pedagógicos, etc.

segunda-feira, 17 de junho de 2019

O PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO - BNCC




Embora, desde que nasce e na Educação Infantil, a criança esteja cercada e participe de diferentes práticas letradas, é nos anos iniciais (1º e 2º anos) do Ensino Fundamental que se espera que ela se alfabetize.  Isso significa que a alfabetização deve ser o foco da ação pedagógica. Nesse processo, é preciso que os estudantes conheçam o alfabetoe a mecânica da escrita/leitura – processos que visam a que alguém (se) torne alfabetizado, ou seja, consiga “codificar e decodificar” os sons da língua (fonemas) em material gráfico (grafemas ou letras), o que envolve o desenvolvimento de uma consciência fonológica (dos fonemas do português do Brasil e de sua organização em segmentos sonoros maiores como sílabas e palavras) e o conhecimento do alfabeto do português do Brasil em seus vários formatos (letras imprensa e cursiva, maiúsculas e minúsculas), além do estabelecimento de relações grafofônicas entre esses dois sistemas de materialização da língua. Dominar o sistema de escrita do português do Brasil não é uma tarefa tão simples: trata-se de um processo de construção de habilidades e capacidades de análise e de transcodificação linguística. Um dos fatos que frequentemente se esquece é que estamos tratando de uma nova forma ou modo (gráfico) de representar o português do Brasil, ou seja, estamos tratando de uma língua com suas variedades de fala regionais, sociais, com seus alofones35, e não de fonemas neutralizados e despidos de sua vida na língua falada local. De certa
maneira, é o alfabeto que neutraliza essas variações na escrita.
Assim, alfabetizar é trabalhar com a apropriação pelo aluno da ortografia do português do Brasil escrito, compreendendo como se dá este processo (longo) de construção de um conjunto de conhecimentos sobre o funcionamento fonológico da língua pelo estudante. Para isso, é preciso conhecer as relações fono-ortográficas, isto é, as relações entre sons (fonemas) do português oral do Brasil em suas variedades e as letras (grafemas) do português brasileiro escrito. Dito de outro modo, conhecer a “mecânica” ou o funcionamento da escrita alfabética para ler e escrever significa, principalmente, perceber as relações bastante complexas que se estabelecem entre os sons da fala (fonemas) e as letras da escrita (grafemas), o que envolve consciência fonológica da linguagem: perceber seus sons, como se separam e se juntam em novas palavras etc. Ocorre que essas relações não são tão simples quanto as cartilhas ou livros de alfabetização fazem parecer. Não há uma regularidade nessas relações e elas são construídas por convenção. Não há, como diria Saussure, “motivação” nessas relações, ou seja, diferente dos desenhos, as letras da escrita não representam propriedades concretas desses sons.
A humanidade levou milênios para estabelecer a relação entre um grafismo e um som. Durante esse período, a representação gráfica deixou de ser motivada pelos objetos e ocorreu um deslocamento da representação do significado das palavras para a representação convencional de sons dessas palavras. No alfabeto ugarítico, por exemplo, as consoantes, mais salientes sonoramente e em maior número, foram isoladas primeiro.
Pesquisas sobre a construção da língua escrita pela criança mostram que, nesse processo, é preciso:
·         diferenciar desenhos/grafismos (símbolos) de grafemas/letras (signos);
·         desenvolver a capacidade de reconhecimento global de palavras (que chamamos de leitura “incidental”, como é o caso da leitura de logomarcas em rótulos), que será depois responsável pela fluência na leitura;
·         construir o conhecimento do alfabeto da língua em questão;
·         perceber quais sons se deve representar na escrita e como;
·         construir a relação fonema-grafema: a percepção de que as letras estão representando certos sons da fala em contextos precisos;
·         perceber a sílaba em sua variedade como contexto fonológico desta representação;
·         até, finalmente, compreender o modo de relação entre fonemas e grafemas, em uma língua específica.
Esse processo básico (alfabetização) de construção do conhecimento das relações fonografêmicas em uma língua específica, que pode se dar em dois anos, é, no entanto, complementado por outro, bem mais longo, que podemos chamar de ortografização, que complementará o conhecimento da ortografia do português do Brasil. Na construção desses conhecimentos, há três relações que são muito importantes: a) as relações entre a variedade de língua oral falada e a língua escrita
(perspectiva sociolinguística); b) os tipos de relações fono-ortográficas do português do Brasil; e c) a estrutura da sílaba do português do Brasil (perspectiva fonológica). Mencionamos a primeira relação ao dizer que a criança está relacionando com as letras não propriamente os fonemas (entidades abstratas da língua), mas fones e alofones de sua variedade linguística (entidades concretas da fala). O segundo tipo de relações – as relações fono-ortográficas do português do Brasil – é complexo, pois, diferente do finlandês e do alemão, por exemplo, há muito pouca regularidade de representação entre fonemas e grafemas no português do Brasil. No português do Brasil, há uma letra para um som (regularidade biunívoca) apenas em poucos casos. Há, isso sim, várias letras para um som – /s/ s, c, ç, x, ss, sc, z, xc; /j/ g, j; /z/ x, s, z e assim por diante –; vários sons para uma letra: s - /s/ e /z/; z - /s/, /z/; x - /s/, /z/, /∫/, /ks/ e assim por diante; e até nenhum som para uma letra – h, além de vogais abertas, fechadas e nasalizadas (a/ã; e/é; o/ó/õ).
Dos 26 grafemas de nosso alfabeto, apenas sete – p, b, t40, d36, f, v, k – apresentam uma relação regular direta entre fonema e grafema e essas são justamente as consoantes bilabiais, linguodentais e labiodentais surdas e sonoras. Essas são as regulares diretas. Há, ainda, outros tipos de regularidades de representação: as regulares contextuais e as regulares morfológico-gramaticais, para as quais o aluno, ao longo de seu aprendizado, pode ir construindo “regras”.
As regulares contextuais têm uma escrita regular (regrada) pelo contexto fonológico da palavra; é o caso de: R/RR; S/SS; G+A,O,U/ GU+E,I; C+A,O,U/QU+E,I;M+P,B/N+outras, por exemplo.

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