BREVE BALANÇO DAS
REFORMAS EDUCACIONAIS
Desde meados dos anos 80 do século passado, o
Brasil experimenta reformas educacionais de natureza progressista, tendo como
referência o acompanhamento do desenvolvimento humano e maior autonomia
escolar. Alterava-se, assim, a ênfase dos objetivos pedagógicos: do resultado
final, tendo como referência um padrão ideal de aluno, para o processo de
aprendizagem, diferenciado de aluno para aluno. Fora dos círculos de debate
sobre política educacional, poucos entenderam a mudança de perspectiva. Na
verdade, poucos conseguem, até hoje, relacionar a forma como educamos nossos
filhos com a maneira como um aluno se desenvolve na escola. O processo de
aprendizagem e desenvolvimento, enfim, é o mesmo.
A partir da mudança de perspectiva, as reformas
introduziram novidades organizacionais e de concepção no sistema educacional
brasileiro. Quatro dessas novidades se destacaram e se disseminaram ao longo do
país:
1 Sistema de Ciclos de
Formação. Cada ciclo é uma série escolar de dois ou três anos de
duração. A base teórica que fundamenta os ciclos são as fases de
desenvolvimento de um ser humano. Piaget já havia estudado o desenvolvimento de
crianças e adolescentes e, desde os anos 30, sugeria que as mudanças
biológicas, cognitivas e morais ocorrem em ciclos. Outros autores se seguiram e
reafirmaram o desenvolvimento a partir de ciclos superiores a doze meses. A
organização em ciclos acompanharia, portanto, as fases de desenvolvimento das
crianças, que nunca são regulares ou lineares (ninguém muda de comportamento ou
sua cognição de acordo com o calendário de doze meses). Os projetos de ensino e
situações de aprendizagem acompanhariam as peculiaridades do desenvolvimento de
cada aluno e turma.
2
Descentralização Administrativa. Coerente com o
sistema de ciclos, as escolas ganharam maior autonomia para elaborar seu
Regimento Interno (forma de gestão, sistema de avaliação, relação com
comunidade, currículo, organização dos tempos escolares) e os conteúdos
escolares a serem desenvolvidos. Grande parte dos recursos financeiros para
estudo e assessoria educacional foi descentralizada. Nunca se investiu tanto em
formação continuada dos professores de ensino fundamental e médio como nos
últimos dez anos.
3
Formação Continuada. Nos últimos dez anos, firmou-se a
convicção que as universidades brasileiras não formam professores. Este não é
um fenômeno nacional. Estudos desenvolvidos pelo professor António Nóvoa, da
Universidade de Lisboa, revelam que o aprendizado de um professor ocorre
efetivamente nos dois primeiros anos da sua carreira. O educador, enfim, não se
faz apenas pela teoria em virtude de se apoiar sempre no relacionamento com o
educando, na sua capacidade de diagnosticar e intuir o desenvolvimento de cada
turma, de saber estruturar um plano de aprendizagem articulado a partir de
situações programadas. A avaliação que faz do educando é múltipla porque
envolve inúmeros indicadores (sociais, de comportamento, de capacidade de
criação, de procedimentos técnicos e metodológicos de estudo e pesquisa, de
compreensão e uso de conceitos). Estas características da profissão de educador
sugerem que a formação continuada do professor se mistura com atividades de planejamento
e de diagnóstico. Por este motivo, deve ser contínua, permanente e exercitada
na própria escola, envolvendo todo corpo docente.
4
Ênfase na Avaliação Sistêmica. A partir de um
seminário organizado pelo MEC em 1990, o país passou a desenvolver inúmeros
métodos de avaliação dos resultados alcançados em todos os sistemas de ensino:
SAEB, Provão, sistemas estaduais. Surpreendentemente, tais sistemas de
avaliação raramente se articularam com as avaliações pedagógicas realizadas em
sala de aula ou nas escolas. O divórcio das duas modalidades de avaliação foi
também conceitual: a sistêmica sempre foi classificatória (apoiada em um padrão
externo de resultado ideal) e quantitativa; as avaliações pedagógicas,
sugeridas na maioria das reformas eram formativas (acompanhando o movimento
errático de desenvolvimento de cada aluno, sem padrão de resultado definido
prescritivamente) e qualitativas.
Passada a década de
noventa, já é possível identificar avanços e problemas acumulados. Gostaria de
destacar dois problemas maiores que parecem bater nas consciências dos
educadores brasileiros. O primeiro
grande problema é o resultado pedagógico. Na medida em que o sistema
educacional brasileiro se democratiza e acolhe mais e mais educandos, os
problemas de aprendizagem ficam mais evidentes. Ficam ainda mais expostos com a
adoção de tantos sistemas de avaliação adotados. Entre tantos, destaco os dados
do PISA. Trata-se de uma pesquisa realizada em 2000 em 32 países, organizada
pela OCDE (Organização para a Cooperação Econômica e Desenvolvimento).
Pretende-se que este teste seja aplicado a cada 3 anos. Em 2000, pouco mais de
265 mil estudantes foram submetidos aos testes de matemática e linguagem. O
Brasil e mais outros três países não-membros da OCDE foram convidados a participar
deste levantamento. O resultado foi extremamente negativo para nosso país.
Nossos alunos apresentaram os piores resultados de aprendizagem dentre os 32
países. Quanto mais baixa a renda familiar, pior o resultado, o que denuncia
nossa democracia social. Mas, mesmo os estudantes de mais alta renda do Brasil
apresentam resultados inferiores à média dos outros 31 países pesquisados,
denunciando o trabalho das redes públicas e privadas. Outros testes
desenvolvidos no país nos últimos dois anos constataram o mesmo.
O
segundo grande problema é o déficit na formação de cidadãos.
Este não é um problema apenas brasileiro. As famílias diminuíram sensivelmente
seu papel na educação básica, primária, de crianças e adolescentes, desde os
anos 70. As escolas, por sua vez, não se prepararam para assumir esta tarefa.
Assim, com o aumento de competitividade econômica e dos convites ao consumo
desenfreado, o abandono social foi potencializado e jogou nossos jovens numa
arena de combate pela sobrevivência ou reconhecimento público. Não conseguimos
desenvolver o tão propalado "protagonismo
juvenil" na grande maioria de nossos estudantes. Mesmo com as inúmeras
inovações, apenas 8% das crianças e dos
adolescentes do mundo dizem ir à escola por prazer (segundo a pesquisa
"Voz das Crianças", da UNICEF). Não estamos educando para que
ganhem autonomia, que ajam solidariamente, que desenvolvam noções de justiça
social.
É o caso, portanto, de
nos perguntarmos: que erros estamos cometendo?
Acredito que um dos
erros é o baixo grau de organização profissional da categoria de educadores.
Desde os anos 80, nós, educadores, nos organizamos para lutar por melhores
condições de trabalho. Mas aprofundamos, de fato, muito pouco sobre o nosso
projeto educacional. Em encontros com
educadores de todo o país, quando perguntamos qual o sistema de avaliação que
propomos, a estrutura curricular, o sistema de promoção de alunos, o modelo de
gestão, a resposta, sem exceção, é um profundo silêncio. Temos nossas opções
individuais, mas não elaboramos nosso projeto de categoria. Sem projeto comum,
não influenciamos na construção de metas, métodos e ações de educação para o
país. Nossa ação, como educadores, continua solitária, isolada. Nossos
problemas são pessoais. O mesmo ocorre com as soluções. Nós, professores,
continuamos passivos em relação à política educacional.
O segundo problema é
a dispersão de programas de formação. São ofertados, todos os anos,
inúmeros programas oficiais e particulares de formação continuada dos
professores. O mercado editorial brasileiro descobriu as escolas e colocou à
disposição, manuais e pequenos textos de apoio para cada tema das reformas.
Ocorre que as orientações metodológicas e conceituais são totalmente distintas,
o que contribui para que os professores não consigam articular as concepções
educacionais aos instrumentos pedagógicos ou didáticos. Tudo vira um grande
comércio, ofertando o produto da moda, o instrumento que dá os melhores
resultados.
Um terceiro erro é a
evidente fragilidade dos sistemas de avaliação pedagógica. O que avaliamos nas
escolas ou mesmo nos sistemas não está redundando em mudanças na prática de
ensino. É uma falácia creditar o erro na famosa "promoção
automática". Não existe nenhuma reforma que sugira a promoção sem mérito.
O que existe é outro conceito: "progressão continuada" que significa
que o aluno é avaliado periodicamente através de inúmeros instrumentos (e não
apenas através de provas) e progride de acordo com sua capacidade, recebendo
atenção específica naquilo em que não obtiver sucesso. Contudo, tanto no ensino
seriado como no sistema de ciclos, as avaliações realizadas não redundam em
alterações no plano de aula que consigam auxiliar na superação das dificuldades
dos alunos. Fazendo uma analogia simplória: é como se um técnico de futebol
avaliasse uma dificuldade de cobrança de faltas num atleta e não desenvolvesse
qualquer programação específica relacionada ao problema detectado. Este hiato é
grave e persiste na história da educação brasileira.
Grande parte dos erros
identificados acima está vinculada às condições e estruturas de trabalho
incompatíveis com exigências das reformas em curso. As reformas sugerem maior
autonomia do professor para elaborar seus planos de aula, para construir os
currículos escolares. Contudo, o tempo de aula continua, com raras exceções,
sendo de 50 minutos; os professores de ensino fundamental ministram aula para
mais de 10 turmas com mais de 40 alunos cada; poucas escolas possuem biblioteca
do professor ou tempo de discussão coletiva para elaborarem uma estratégia
comum entre professores de uma mesma turma; a maioria dos professores ministra
aulas em mais de duas escolas. Como exigir autonomia, criatividade, capacidade
de acompanhar com atenção cada aluno e turma com tais condições de trabalho e
jornada extensiva e intensiva?
Finalmente, um último
erro. Estamos dissociando a educação formal da educação informal dos educandos.
Em outras palavras, o que fazemos em sala de aula não se articula com o
aprendizado na rua, nas tribos de adolescentes e de amigos, ou mesmo na família
e na comunidade em que o aluno vive. E, para ser sincero, o aprendizado
informal está sendo muito mais útil e vivo que aquele que ocorre nas salas de
aula. A competição, no caso, está desequilibrada. Precisamos aprender com as
ruas e com as ongs. Muitas ongs descobriram métodos e espaços diferenciados de
aprendizagem e conseguem envolver crianças e adolescentes em situação de risco.
Educam, de fato. Nossas escolas precisam aprender com tais iniciativas. Este é
o caso do Circo de Todo Mundo, de Belo Horizonte, uma ong que utiliza o espaço
circense como projeto educacional. Utilizando o mesmo conceito uma escola
pública, de Brasília, a Escola dos Meninos do Parque, desenvolve um projeto
pedagógico similar.
Na educação aprendemos
que os erros são mais sinceros que as respostas certas dos alunos. Revelam sua
alma e seu esforço. É com eles que os professores engajados trabalham e estudam
para elaborar seus planos de trabalho. Seguindo esta trilha poderemos superar
nossos fracassos da última década. Temos que enfrentá-los para reafirmar o
ímpeto e desejo das reformas educacionais. Para que a intenção seja acompanhada
do gesto.
Muito bom este texto de RICCI. Cada leitura
que fazemos é mais um aprendizado que adquirimos.
Bem, de tudo que estudamos até agora, podemos
observar alguns pontos que marcaram a história e a estrutura da educação
brasileira, quais sejam a seguir:
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) foram a referência básica para a elaboração
das matrizes
de referência. Foram elaborados para difundir os princípios da reforma
curricular e orientar os professores na busca de novas abordagens e
metodologias. Eles traçam um novo perfil para o currículo, apoiado em
competências básicas para a inserção dos jovens na vida adulta; orientam os
professores quanto ao significado do conhecimento escolar quando
contextualizado e quanto à interdisciplinaridade, incentivando o raciocínio e a
capacidade de aprender.
LEI Nº 11.274, DE 6 DE FEVEREIRO DE 2006
- Altera a redação dos artigos: 29, 30, 32 e 87 da Lei 9.394, de
20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação
nacional, dispondo sobre a duração de 9 (nove) anos para o ensino fundamental, com
matrícula obrigatória a partir dos 6 (seis) anos de idade.
ORGANIZAÇÃO DOS SISTEMAS DE ENSINO
Vejamos agora a organização do ensino brasileiro
nas disposições normativas das três Leis de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional:
Lei
4.024/61
|
Duração
|
Lei
5.692/71
|
Duração
|
Lei
9.394/96
|
Duração
|
Ensino
Primário
Ciclo
Ginasial do Ensino Médio
Ciclo
Colegial do Ensino Médio
Ensino
superior
|
4
anos
4
anos
3
anos
Variável
|
Ensino
de primeiro Grau
Ensino
de segundo Grau
Ensino
Superior
|
8
anos
3
a 4 anos
Variável
|
Educação
Básica
-
Educação Infantil
>
Creche
>
Pré-escola
-
Ensino Fundamental
-
Ensino Médio
Educação
Superior
|
>17 anos
>5
anos:
*
3 anos
*
2 anos
>
9 anos
>3
ans (míni.)
>Variável
|
OBS.
|
OBS.
|
OBS.
|
1) A passagem
do Primário para o Ginasial era feita através de uma prova de acesso: o Exame
de Admissão.
2) Os ciclos
Ginasial e Colegial eram divididos em ramos de ensino a saber: Secundário
Comercial, Industrial, Agrícola, Normal e outros. O Industrial dividido em:
básico (4 anos) e de mestria (2 anos). Havia, ainda, os cursos artesanais, de
duração curta e variável, e os de aprendizagem.
|
1) Com a junção
dos antigos Primário e Ginasial, desapareceu o Exame de Admissão.
2) A duração
normal do segundo grau era de três anos. Ultrapassava, no entanto, este
limite quando se tratava de curso profissionalizante.
3) O ensino de
primeiro e segundo graus tinha uma carga horária mínima anual de 720
horas e o ano letivo de duração mínima
de180 dias.
|
1) Os níveis
macroestruturantes da Educação Escolar (Art. 1°, § 1°) passam a ser dois: Educação Básica e Educação Superior.
2) As
modalidades de educação inicialmente são: Educação de Jovens e Adultos (Art.
37), Educação Especial (Art. 58), Educação Profissional (Art. 39) e Educação
Escolar Indígena (Art. 78). Com a Res.CNE/CEB 4/2010, por via do Art. 27,
foram acrescidas: Educação do Campo e Educação a Distância.
3) A Educação
Básica, nos níveis Fundamental e Médio, passa a ter carga horária mínima de
800 horas anuais, distribuída em 200 dias letivos anuais, no mínimo.
|
BIBLIOGRAFIA
BÁSICA
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria
de Educação Básica. Secretaria de Educação Continuada. Alfabetização,
Diversidade e Inclusão. Secretaria de Educação Profissional e Tecnologia.
Conselho Nacional de Educação. Câmara Nacional de Educação Básica. Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais da
Educação Básica. Brasília, MEC, SEB, DICEI, 2013.
CARNEIRO, Moaci Alves. LDB Fácil: leitura crítico-compreensiva artigo a artigo. 23 ed.
revista, atualizada e ampliada. Petrópolis - RJ: Voes, 2015.
PILETTI, N. Estrutura e
funcionamento do Ensino Fundamental. São Paulo: Ática, 2001.
SAVIANI, D. Da nova LDB ao novo
plano nacional de educação: por uma outra política educacional 3. ed.
Campinas: Autores Associados, 2000.
---------- Educação Brasileira: estrutura e sistema. 8. ed. Campinas: Autores
Associados, 2000
SAVIANI, D et al. O Legado Educacional do Século XX no Brasil. 2 ed. Campinas – SP:
Autores Associados, 2006. (Coleção Educação Contemporânea).
SOUZA, Rosa Fátima de. Lições da Escola Primária. In: SAVIANI,
Dermeval et. al. O legado educacional
do século XX no Brasil. Campinas, SP: Autores Associados, 2004
VIEIRA Alexandre Thomaz et al. Gestão Educacional e Tecnologia
(Coleção Formação de Educadores). São Paulo: Avercamp,2003.